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quinta-feira, 1 de março de 2018

As primeiras gravações com bateria e percussão no Brasil

Pesquisar sobre determinados períodos ou artistas da música brasileira é lidar com uma série de dificuldades e contradições ocasionadas pela grande falta de registros e documentações. Mas com uma boa dose de interesse, cuidado e atenção, podemos achar uma boa bibliografia, uma vasta discografia – entre outras fontes – para então confrontar os dados e obter resultados satisfatórios na construção de novos conhecimentos. E é neste sentido que preparamos um breve estudo cronológico destacando importantes gravações em busca de contextualizar a bateria brasileira com a nossa música popular e com o desenvolvimento da indústria fonográfica brasileira.


Vamos começar com dois momentos importantes que marcam o início da indústria fonográfica brasileira:


  • 1879 – Chegada do fonógrafo ao Brasil através de seu inventor Thomaz Edison.


(Thomas Edison ao lado de sua grande invenção, o fonógrafo / site: seuhistory.com)


  • 1900 – Inauguração da Casa Edison pelo empreendedor Fred Figner comercializando produtos como discos, cilindros e fonógrafos. 
(Casa Edison na Rua do Ouvidor, Rio de Janeiro / site: somshow.com.br/memoria/historia/a-casa-edison)


Agora sim, vamos às gravações:

  • 1902 – Primeira gravação musical com artista brasileiro.
Música: Isto é bom (ouça aqui)
Composição: Xisto Bahia
Interpretação: Baiano
Gênero indicado: Lundu

  • 1916 – Primeiro samba gravado*. 
Música: Pelo Telefone (ouça aqui)
Composição: Donga e Mauro de Almeida
Interpretação: Baiano
Gênero indicado: Samba


*Antes disso, outras músicas foram gravadas e indicadas como samba, mas Pelo telefone foi a primeira reconhecida como tal, e partir de seu lançamento, o samba assumiria o posto de principal gênero musical brasileiro.

  • 1927 – Primeiras gravações com bateria*

Música: Albertina (ouça aqui)
Composição: Antônio Lopes de Amorim Diniz
Interpretação: Francisco Alves
Acompanhamento: Orquestra Pan Americana do Cassino Copacabana (dirigida por Simon Bountman)
Baterista: Aristides Prazeres (ou Luciano Perrone)**
Gênero indicado: Marcha
Disco: Odeon 10.001/A - Matriz 1162***

*A partir de 1927 foi iniciado o sistema elétrico de gravação, pela Odeon no Rio de Janeiro. O novo processo de gravação, que passaria a substituir a fase de gravações acústicas, dispunha de microfones, fios e amplificadores, possibilitando a captação de outras frequências sonoras (até então não captadas), podendo gravar mais instrumentos e favorecendo novas formas de interpretação vocal.

**Alguns pesquisadores afirmam que o primeiro baterista a gravar teria sido Luciano Perrone, que integrou a Orquestra Pan Americana. Porém, para Jairo Severiano (2008) quem ocupava as baquetas da orquestra em 1927 era Aristides Prazeres.

***Este foi o primeiro disco elétrico a ser lançado no Brasil, porém não foi o primeiro a ser gravado. O primeiro, lançado com o nº 10.006 (ouça aqui) seria de Carlos Serra (mas ainda sem o acompanhamento de bateria ou percussão).

  • 1929 – Primeira gravação com percussão (característica do samba)*
Música: Na Pavuna (ouça aqui)
Composição: Almirante e Candoca de Anunciação
Interpretação: Almirante e Bando de Tangarás**
Acompanhamento: Carolina Cardoso de Menezes (piano), Luperce Miranda (bandolim) e percussionistas anônimos.
Gênero indicado: Choro de rua
Disco: Parlophon 13089 A (matriz 3179)

*Gravado em 30 de novembro de 1929, lançado em janeiro de 1930 e grande sucesso no carnaval do mesmo ano, Na Pavuna registra a primeira gravação com surdo, tamborim e pandeiro (instrumental percussiva característica do samba).

**Grupo formado por Almirante, Noel Rosa, Alvinho, Braguinha (João de Barro) e Henrique Brito.


  • 1931 – Primeiro solo de bateria gravado no Brasil*
Música: Faceira (ouça aqui)
Composição: Ary Barroso
Interpretação: Sílvio Caldas
Acompanhamento: Orquestra RCA Victor / Arranjo: Pixinguinha
Baterista: Luciano Perrone
Gênero indicado: Samba

*Entende-se como solo de bateria, estes pequenos espaços de dois compassos onde o instrumento se destaca. Esta foi a primeira gravação a evidenciar a bateria.


  • 1934 – Primeira gravação que concedeu a um baterista o feito de ter seu nome registrado em disco*

Música: Preludiando (ouça aqui)
Composição: Carolina Cardoso de Menezes
Interpretação: Carolina Cardoso de Menezes (ao piano)
Baterista: Valfrido Silva**
Gênero indicado: Fox-blue

*Neste período os discos indicavam somente intérprete, compositor e o nome do grupo que acompanhava (na parte instrumental), mas não especificava detalhadamente cada músico que atuou na gravação. Como nesta faixa o único acompanhante foi o baterista – sendo gravada a piano e bateria – o disco ficou com o seguinte registro: “Solo de piano por Carolina Cardoso Menezes com Walfrido na bateria”.

**O nome do baterista é frequentemente encontrado em registros como “Walfrido”. Se você encontrar este nome em autorias de músicas gravadas por Carmen Miranda, por exemplo, não tenha dúvidas: trata-se de Valfrido Pereira da Silva (baterista e compositor).

...

Vale ressaltar que o período abordado nesta matéria corresponde com a primeira fase da bateria brasileira, ou seja, aos bateristas da primeira geração onde predominou o que chamamos de “samba batucado”.

E aí? O que achou?

Envie suas dúvidas, comentários e sugestões. Não deixe de compartilhar, interagir e acompanhar nossa jornada musical pela história e desenvolvimento do nosso instrumento. Até a próxima!





Referências:

ALBIN, Ricardo Cravo. Dicionário Houaiss Ilustrado Música Popular Brasileira. Rio de Janeiro, Instituto Antônio Houaiss, Instituto Cultural Cravo Albin e Editora Paracatu, 2006.

BARSALINI, Leandro. As Sínteses de Edson Machado: Um Estudo sobre os padrões de Samba na bateria. Campinas, Unicamp, 2009.

BARSALINI, Leandro. Modos de execução da bateria no samba. Campinas, Unicamp, 2014.

CABRAL, Sérgio. A MPB na era do Rádio. São Paulo: Moderna, 1996. – (Coleção Polêmica).

CABRAL, Sérgio. As escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Lumiar, 1996.

CABRAL, Sérgio. No tempo de Ary Barroso. Editora Lazuli LTDA, 2016.

DAMASCENO, Alexandre. A batucada fantástica de Luciano Perrone: sua performance musical no contexto dos arranjos de Radamés Gnattali. Campinas, Unicamp, 2016.

SEVERIANO, Jairo. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. São Paulo: Ed. 34, 2008.

TINHORÃO, José Ramos. História Social da Música Popular Brasileira. São Paulo: Editora 34, 1998.

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